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A Argentina terminou 2023 com uma taxa de inflação anual de 211,4%, o que a torna o país com o maior aumento de preços da América Latina e a coloca entre os maiores índices do mundo. Os dados são do Instituto Nacional de Estatística e Censo (INDEC), que na quinta-feira (11) anunciou que, durante o mês de dezembro, a inflação chegou a 25,5%, dobrando o índice de preços do mês anterior, que tinha sido de 12,8%. Trata-se do índice mensal mais alto desde fevereiro de 1991, quando o país estava saindo de um ciclo de hiperinflação. 

Até o último mês de novembro, diferentes institutos de pesquisa calculavam que o ano terminaria com uma taxa de inflação de 160%. Um número preocupante que, por si só, excedia em muito o aumento de preços acumulado em 2022, que havia sido de 94,8%. No entanto, as primeiras medidas econômicas adotadas pelo governo de extrema direita do presidente Javier Milei, que incluíram uma drástica desvalorização do peso frente ao dólar e um aumento nas tarifas, deram novo impulso à dinâmica inflacionária.

O informe do INDEC ainda mostra que os maiores aumentos ocorreram em áreas particularmente sensíveis para os setores mais vulneráveis da sociedade, como alimentos e saúde, que aumentaram 251,3% e 227,7%, respectivamente.

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Nesse contexto, cidadãos argentinos de diferentes contextos sociais dizem sentir uma piora em suas condições de vida e denunciam que os planos do governo Milei devem aprofundar a vulnerabilidade.

Monica Alexander é moradora da Villa 21-24, uma das maiores favelas de Buenos Aires. Em conjunto com outros moradores, ela comanda há anos, em sua própria casa, um “comedor comunitário”, parte de um plano de restaurantes populares subsidiado pelo Estado. Ao Brasil de Fato, ela afirma que o governo parou de entregar os alimentos necessários para atender a população.

“Não conseguimos dar conta do número de pessoas que chegam. Todos os dias chegam novas pessoas, muitas delas têm trabalho, mas não é suficiente e no meio do mês não têm dinheiro suficiente para comprar comida”, diz. Este é o sexto ano consecutivo em que os trabalhadores e aposentados veem sua renda se deteriorar. De acordo com cálculos da consultora Ecolatina, somente durante o mês de dezembro de 2023, a queda nos salários do setor formal foi de 10%, a maior em mais de 20 anos.

“Todos nós sabíamos que as medidas do novo governo teriam um grande impacto, mas o que nos surpreendeu foi a velocidade com que elas aconteceram”, explica Amitai Duek. Ao Brasil de Fato, o escritor que mora na região central da capital argentina diz que as medidas ortodoxas adotadas por Milei se refletiram de maneira muito rápida na economia das pessoas. “Quando você vai aos supermercados você vê que eles estão vazios, as pessoas compram menos e fazem contas para comprar as coisas básicas e indispensáveis”, diz.

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Amitai ainda aponta que um de seus maiores problemas tem sido a moradia. Isso porque os proprietários do imóvel alugado onde ele mora começaram a exigir aumentos que violam o contrato assinado, algo que, segundo ele, “já está acontecendo com muitas pessoas”. 

O problema da moradia é um drama que ameaça se tornar uma verdadeira bomba-relógio. Através do Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), com o qual Javier Milei pretende revogar e modificar 366 artigos de lei, o governo removeu todos os tipos de regulamentação dos contratos de aluguel. De acordo com a Federação Nacional de Inquilinos, isso possibilitou o aumento das renovações de contratos de aluguel em 300% a 600% e muitos proprietários estão exigindo que os aluguéis sejam pagos em dólares.

“O ano passado foi bastante difícil do ponto de vista econômico, mas agora, neste último mês, a incerteza aumentou muito graças à inflação”, conta Luisina Darthes. A estudante disse ao Brasil de Fato. que ela e o namorado tiveram que deixar a vida em Buenos Aires por conta do aumento nos preços.

“Ultimamente tem sido impossível pagar o aluguel, por isso nos mudamos para outra cidade, onde a moradia ainda é um pouco mais acessível em termos de preços e condições contratuais. Na capital, os preços são exorbitantes, os contratos são publicados em dólares e os reajustes são trimestrais, vinculados ao índice de inflação, o que não é proporcionalmente acompanhado por um aumento nos salários, esse é o maior problema”, explica 

Futuro de Milei e greve geral

Nas próximas semanas, o governo de Javier Milei terá que navegar em um delicado espaço no qual seu destino está em jogo. Desde que assumiu o cargo no dia 10 de dezembro, o presidente vem promovendo as maiores reformas econômicas e políticas desde o retorno da democracia argentina, em 1983. Enquanto isso, o clima social parece ter cada vez menos espaço para tolerar novos ajustes.

No início desta semana, o Congresso iniciou uma sessão extraordinária para debater mais de 600 artigos que fazem parte de um projeto de lei promovido pelo Executivo intitulado “Bases e pontos de partida para a liberdade dos argentinos”, que tem como objetivo reformar quase todos os aspectos da ordem jurídica do país. Ele concede poderes extraordinários à Presidência para que ela possa legislar sem o Congresso, permite a privatização de todas as empresas públicas, remove todos os regulamentos para que o governo reestruture a dívida externa e criminaliza os protestos sociais de uma forma inédita desde o fim da ditadura militar (1976-1983).

O ministro da Economia, Luis Caputo, anunciou na quarta-feira (10) um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para liberar US$ 4,7 bilhões que o país usará para pagar sua dívida com o próprio fundo. O anúncio foi feito depois que o FMI felicitou o governo por seu “ambicioso programa de estabilização”, mas advertiu que não continuaria produzindo os desembolsos se não conseguisse uma “implementação contínua e duradoura” do ajuste fiscal.

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“Há aspectos desse projeto de lei que têm implicações fiscais significativas e, como tal, esperamos que as autoridades continuem a obter apoio político para levar esse projeto adiante”, disse a diretora de comunicações do FMI, Julie Kozack, em uma coletiva de imprensa em Washington na manhã de quinta-feira (11). 

Por outro lado, a poderosa Central Geral de Trabalhadores (CGT), juntamente com outras centrais sindicais do país, já anunciou uma greve geral para o dia 24 de janeiro. Entre suas reivindicações, a representação dos trabalhadores exige a revogação do megaprojeto de lei e do megadecreto de necessidade e urgência. A ação sindical se junta a uma série de manifestações que vêm ocorrendo no país desde o anúncio das medidas econômicas e políticas do governo. Junto com a mobilização, aproxima-se o mês de março, quando a Argentina discute atualizações salariais nos setores formais. 

Edição: Lucas Estanislau






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